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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

NICE TO MEET YOU, MR. SINGH



Apesar dos cabelos timidamente grisalhos, aquele homem sustentava espírito e aparência jovens. O cavanhaque e o rabo de cavalo, preso por um elástico azul, conferiam-lhe ares de músico de blues do Bronx nova-iorquino e eram apelos tentadores para uma conversa informal. Hey, man, what’s up? – pensei ao me aproximar. O protocolo da situação e o exigido respeito àquela autoridade científica, no entanto, levaram-me a balbuciar, apenas, um educado Nice to meet you, Mr. Singh.


A postura de certa forma desembaraçada não encobria a elegância intelectual que se estampava no rosto afilado, por trás das lentes de um óculos disposto em armação retangular. O homem era deveras inteligente. Em passos que iam e vinham pelo salão de conferências, estava ansioso pelo início das atividades previstas para aquele sábado nublado, 13 de novembro de 2010.


O intelectual do semblante descontraído e da cabeleira peculiar era Gurkirpal Singh, 49, um dos maiores peritos mundiais na discussão sobre diretrizes e balizas regulatórias para medicamentos biológicos e convidado do I Fórum Nacional de Biossimilares.


Dr. Singh, professor na Divisão de Gastroenterologia e Hepatologia da Escola de Medicina da Universidade de Stanford, na Califórnia, é consultor da U.S. Food and Drug Administration (FDA), onde coopera na discussão sobre a regulamentação de biológicos inovadores e de similares. O conhecimento de causa o habilitava a proferir, com perícia e argumentos bastante estruturados, a palestra Regulatory Pathways in USA and Europe, que tratou sobre aspectos de segurança na fiscalização da produção de biomedicamentos nos contextos europeu e norte-americano. Certamente, uma fala obrigatória em um evento que se propunha a discutir parâmetros de regulamentação dos biossimilares.


Durante seu discurso, a inquietação científica articulava-se por meio da eloquência que, ainda que notadamente abundante, talvez não conseguisse acompanhar à rapidez de seu raciocínio. As mãos, também inquietas, pareciam extensões de seu cérebro, aflitas em contribuir com aquilo que era expresso pelas palavras.


Em linhas gerais, a mensagem de Singh enfatizou a importância da regulação específica aplicada à produção de biossimilares - tal como já ocorre em países como Taiwan, Malásia, Austrália e Suíça, por exemplo. A regulamentação visa ao controle e à supervisão durante as etapas da bioprodução, as quais devem atentar a medidas que garantam qualidade e conformidade dos medicamentos similares com as balizas técnicas.


Gurkirpal Singh nasceu na Índia. A pele em tom amorenado, tão característica a cidadãos naturais da Ásia Meridional, o faria passar por brasileiro. Aliás, Mr. Singh é um entusiasta da nossa terra brasilis – da cultura popular à produção acadêmica. Sobre o cenário nacional dos medicamentos biológicos, comentou: “estou esperançoso de que o Brasil siga todos os parâmetros da comunidade cientifica”.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O DIA EM QUE CURITIBA TREMEU

Livro relembra a explosão do caminhão de dinamite



Uma tragédia que muitos curitibanos não conhecem. Uma história, no mínimo, explosiva. O dia era dois de setembro de 1976. Um caminhão que transportava dinamite explodiu em Curitiba. Da explosão, eclodiram prejuízos, feridos e mortos nas redondezas dos bairros Cabral, Juvevê e Ahú.

Depois de mais de três décadas em quase esquecimento, a detonação da dinamite e a narrativa de seus envolvidos estão agora retratados em Dinamite – Uma tragédia em Curitiba, livro-reportagem da jornalista Anna Carolina Azevedo. A obra acaba de ser editada e publicada pela Secretaria de Estado da Cultura do Paraná (SEEC/PR) e será lançada no próximo dia 19 de agosto, nas Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil).

A ideia de Dinamite – Uma tragédia em Curitiba surgiu em 2007, quando Anna Carolina ouviu, por acaso, uma conversa cujo assunto era um tal de “o dia do cogumelo”. O tema instigou a autora que, a partir de então, passou a pesquisar a respeito da explosão. A apuração sobre a tragédia curitibana resultou em um projeto de livro-reportagem, defendido como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Comunicação Social - Jornalismo, em 2008.

“O resultado obtido por Anna Carolina é muito satisfatório porque seu trabalho se funda em uma apuração muito rigorosa, utilizando métodos investigativos e literários raros nos dias atuais. Além disso, consegue construir um retrato rico da cidade de Curitiba à época da explosão”, afirma Maura Oliveira Martins, coordenadora do curso de Jornalismo da UniBrasil e orientadora do TCC.

Anna Carolina comenta que o objetivo da publicação é o de rememorar um episódio importante para a cidade, mas que estava relegado à lembrança de uma geração passada. “A explosão sensibilizou a população décadas atrás. No entanto, a maioria das pessoas hoje aqui residentes não tem referências mínimas sobre ela ou mesmo a desconhecem”, explica.

Para noticiar a tragédia, a autora narrou a sequência dos fatos que culminariam na explosão, esboçando um retrato do que aconteceu antes e após o caminhão ter se esvaído pelos ares e daquilo que as pessoas estavam fazendo na hora do acidente. Toda a narrativa está descrita sob o pano de fundo do contexto histórico-social da Curitiba de meados da década de 70.

A partir da pesquisa – a qual se desdobrou das consultas aos jornais da época às andanças pelas ruas -, foi possível esboçar o retrato de um dos principais eventos trágicos ocorridos na cidade. As descobertas resultaram em uma produção jornalística que apresenta ao público-leitor um panorama do que ocorreu naquela (não tão) distante tarde de quinta-feira de 76. O dia em que Curitiba tremeu.


Palestra
Além de fazer uma abordagem sobre o livro, a jornalista falará também sobre as processualidades que envolveram concepção, produção e viabilização de um projeto que obteve resultados para além do âmbito acadêmico. “Acredito na importância desse tipo de relato aos alunos que estão produzindo seus projetos experimentais, pois reflete etapas pelas quais todos passam quando da elaboração de um TCC”, completa Maura.

Dinamite – Uma tragédia em Curitiba estará à venda na ocasião do lançamento.






















A jornalista Anna Carolina Azevedo, 24, lançará seu livro na UniBrasil.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

TRAGÉDIA EM ANGRA

Chuva devasta Ilha Grande - a maior e mais povoada de todas as 365 ilhas que desenham litoral angrense


Logo na primeira madrugada de 2010, deslizamentos de terra atingiram Angra dos Reis, fizeram sucumbir várias casas e vitimaram quase meia centena de vidas. Quem à noite comemorava as entradas de um novo ano, pela manhã lamentava a destruição impiedosa, que acompanhou as primeiras horas do nascer de mais uma década.

As tempestades, que tiveram início em 30 de dezembro, prenunciavam uma tragédia iminente. O réveillon seria interrompido não pela chegada da meia-noite, mas, sim, pelo irromper das toneladas de terra que se desprenderam das encostas que rodeiam a cidade de Angra. Barro que soterrou casas, vidas e sonhos para um 2010 recém-chegado.

Parte das instalações da pousada Sankay, atingida pelo desabamento em Ilha Grande, foi completamente destruída. O que restou daquela noite, não apenas no reduto de turistas, mas também nas casas de moradores da cidade, esboça o desespero de quem teve sua vida atropelada pela intempérie da natureza. Na região da pousada, as equipes ainda procuram por corpos de quatro mulheres que continuam desaparecidos. Não há previsão para o término das buscas.

Até às 20 horas deste domingo, 46 eram as vítimas fatais dos soterramentos em Angra. Na manhã de hoje (4), equipes do Corpo de Bombeiros localizaram o corpo de mais um homem soterrado no morro da Carioca.


Os serviços de meteorologia prevêm um verão com muitas e severas chuvas na região do litoral sul do estado do Rio de Janeiro.

Coletiva
O prefeito de Angra dos Reis, Tuca Jordão, concedeu entrevista coletiva para falar sobre a tragédia causada pelas chuvas na cidade. Jordão afirmou que em apenas três dias o índice pluviométrico registrado foi superior a 500 milímetros. A prefeitura estima que os deslizamentos na virada do ano tenham causado um prejuízo de cerca de R$ 250 milhões

A TRAGÉDIA DE ANGRA DOS REIS

Número de mortos em deslizamentos na cidade fluminense sobe para 46


Wilton Júnior/AE

Vista aérea da pousada do Sankay, atingida por deslizamento na Ilha Grande

Com portal R7.com

Na tarde deste domingo (3), equipes do Corpo de Bombeiros localizaram mais duas pessoas soterradas em Angra
dos Reis. Os corpos localizados - um homem e uma mulher - foram encaminhados ao Instituto Médico Legal para a identificação. Com isso, sobe para 46 o número de vítimas dos deslizamentos causados pelas chuvas que atingem a região desde o último dia 30 de dezembro; 17 no morro da Carioca, região central de Angra, e 29 na praia do Bananal, em Ilha Grande.

De acordo com as equipes, ao menos quatro pessoas permanecem desaparecidas. Os bombeiros continuam trabalhando para a localização e contam com a ajuda de cães farejadores. O decreto de calamidade pública, que foi divulgado no mesmo dia da tragédia, entrará em vigor a partir de hoje (4).


Mais de cem homens trabalham nas buscas na praia do Bananal e no morro da Carioca. Na região da pousada Sankay, as equipes ainda procuram por quatro mulheres que continuam desaparecidas. Duas são moradoras e outras duas são turistas. Não há previsão de término das buscas e técnicos da Defesa Civil têm avaliado o solo do morro para estudar a retirada de mais famílias da área de risco. A secretaria municipal de educação ofereceu as escolas para alojar os desabrigados.


Moradores de Angra dos Reis deixam área condenada pela Defesa Civil


Matéria exibida no Fantástico deste domingo, 3.


Uma equipe de repórteres do programa teve acesso a um dos locais atingidos pelo desmoronamento na Ilha Grande. Acompanhados pelo comandante-geral do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, o repórter André Luiz Azevedo e o repórter cinematográfico Carlos Trinta entraram na pousada Sankay, onde encontraram um cenário de lama e destruição.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

UFANIA


As histórias são as mesmas e se repetem a cada vez em que o gravador da ufania insiste em reproduzir os ecos do passado. Lembranças saudosistas (ah, as velhas lembranças!) povoam o imaginário dos que procuram nas linhas anacrônicas da existência o consolo para o medo do porvir. A incerteza de que o “tempo bom” jamais retorne é um poço profundo: prostra no pretérito quem não se surpreende com o presente.

Velhos tempos... “Os anos mais felizes”. Assim sempre serão; pelo menos, àqueles que se frustram diante do novo ininterrupto. Repetições se prolongam: “aquele brinquedo”, “aquele professor”, “aquele amor”, e “aquele brinquedo” e “aquele professor” e “aquele amor”. O gosto da novidade não está nos lábios de quem se afoga nos sabores do mais do mesmo.

Por que não “este amor”? Este tempo (o avanço das tecnologias, a cura para as doenças, a consolidação da democracia, a liberdade de expressão e tantos outros adventos de uma nova era) é o tempo que passa despercebido nas rodas e cirandas permeadas por um suposto “mais-que-perfeito”. Aliás, muitas vezes, tão ou mais imperfeito quanto o agora.

Ah, as velhas lembranças... Ilusórias, fecham os olhos para o colorido do hoje, do amanhã, do depois. O inesperado sempre está adiante, ao alcance das mãos do contemporâneo e satisfeito. Mas talvez não à vista dos ufanistas do passado. Saudosistas eternos: A MEMÓRIA É UM AFAGO À CONSCIÊNCIA ENTERRADA NO ONTEM.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

LÍNGUA: VIDAS EM PORTUGUÊS

Documentário exalta diversidade da "nossa língua portuguesa"







Rio de Janeiro, Brasil. Em uma tarde por demais ensolarada, um homem de camisa branca, caprichosamente abotoada até o colarinho, discursa para uma platéia distraída. Passageiro de um ônibus que trafega pelas ruas do Leblon, ele carrega uma carga de balas de morango, separadas em pacotes menores que custam cinquenta centavos cada.


Esse homem oferece as balas aos seus, quem sabe, compradores por meio da fala pedante que, se não atrai pela cena comum em tantos coletivos, surpreende pela persuasão da venda. Ele fala atropelando o estigma do “mero vendedor”, sentenciando seu dicionário esforçadamente rebuscado que, por instantes, lhe confere ares de orador. O homem das balas se detém na tentativa, honesta e desajeitada, de dispensar fino trato não apenas à aparência, quase que ridiculamente engomada. Sua verdadeira elegância está na articulação de seu principal instrumento de trabalho: a língua portuguesa, patrimônio pessoal do vendedor carioca e de outros 200 milhões de habitantes espalhados pelo mundo. Pessoas separadas pela distância, mas unidas pelo idioma falado.


Essa é uma das cenas esboçadas em Língua: Vidas em Português, documentário luso-brasileiro (2002) que mostra que a língua que une pelo vocabulário, pela sintaxe ou por qualquer outra instância gramatical é a mesma que diferencia e confere identidade a povos distantes em suas culturas e em modos de vida.


A peça, dirigida pelo documentarista moçambicano Victor Lopes, expõe em depoimentos de falantes do português, ilustres e anônimos, as relações entre língua e sociedade, na tentativa de estabelecer aspectos em comum dentre a vida certamente distinta nos países que adotam a Língua Portuguesa como um de seus idiomas.


Ainda que o português falado no Brasil, em Portugal, em Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Macau (China), Goa (Índia) ou em outros lugares tenha origens mesmas, ele não é o mesmo. Cada um desses “portugueses” utilizados por povos tão diversos está carregado pela cultura de seus falantes, permeado por heranças íntimas de nacionalidade, edificado em um chão de uma pátria única. Os países são vários. As culturas são ricamente diversificadas. Os esquemas sociais são diferentes. A língua, pois, assim também o é. Mesmo com a alcunha comum, chamada de “Língua Portuguesa”, a língua de povos incomuns não é comum. Ou melhor: é comum em sua origem, em seu passado. Mas o português, já há muito, não é o mesmo em tantos lugares.


Não, definitivamente não. O português “pseudo-garboso” do vendedor-orador do Rio de Janeiro não é o mesmo português dos fados de Portugal ou o da periferia moçambicana. E o documentário, de fato, evidencia essa conjectura. Aliás, o cenário das vicissitudes das tantas línguas portuguesas é mais do que legitimado por um dos grandes nomes da prosa da “última flor do Lácio”. Diz José Saramago, escritor: “não há língua portuguesa, há línguas em português”. Ora, se Saramago assim sentencia, o documentário aponta para mesma direção: os diferentes modos de falar a “língua-mãe” não são comuns. São únicos.



Assista ao trailler do filme na TV UOL.