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quarta-feira, 8 de abril de 2009

JORNALISMO MAIÚSCULO



Em celebração ao Dia do Jornalista, comemorado em 7 de abril, o PERIÓDICAS publica um texto de uma das mais brilhantes dessas profissionais.


Eliane Brum, repórter especial da Revista Época, mostra que, mais do que por fatos ou cenários, as histórias são feitas por pessoas. A jornalista se debruça no esmiuçar das tragédias e comédias de Zés e Marias, ofuscados pela sombra da mediocridade dos que reconhecem apenas as figuras notáveis como pautas relevantes.

A cada retrato de personagem esboçado, Eliane revela, em sutileza, que as vidas comuns, singulares em suas diferenças e extraordinárias mesmo em anonimato, são, sim, surpreendentes. "A vida que ninguém vê" pode ser mais colorida do que os fatos acinzentados narrados no dia-a-dia do jornalismo das notícias passageiras.

Ao desvendar a grandiosidade do ser humano em matérias de jornal, Eliane Brum dá a certeza de que um jornalismo mais humano é possível.

Boa leitura!

EVA CONTRA AS ALMAS DEFORMADAS

(...) Eva ingressou na universidade, mas não podia pagar. Por duas vezes lhe negaram o crédito educativo. Pediu transferência para uma mais barata. Eva sonhava em ser educadora. Queria ensinar como se podia escrever com as mãos em chagas. E fazer das mãos retorcidas asas. Mas muitas eram as almas disformes que se colocariam entre Eva e o mundo. A luta estava recém no começo e provavelmente não terá fim.

Ela ouviu e ouviu. Como vai escrever no quadro-negro tremendo desse jeito? Como vai ensinar com uma letra tão feia? Não vê que só vai incomodar? Não entende que entre você e uma menina normal vão escolher a normal? O que você quer? Vai passar a vida olhando para um diploma na parede? Eva ouviu tudo isso de uma educadora. Eva ouviu tudo isso na faculdade. Apenas para comprovar que a ignorância está onde menos se espera. Eva, a deficiente física, respondeu à deficiente de alma:

- Em primeiro lugar, eu não vou desistir. Em segundo, a vida é um risco. Não só para mim. Mas para todo mundo.

Eva demorou a descobrir por que sua tremedeira ameaçava tanto aqueles seres impávidos. Qual era a ofensa de sua fragilidade. Foi vilipendiada de todas as formas conhecidas e outras inventadas só para ela. Primeiro, impediram que fizesse estágio. Depois, só poderia fazê-lo numa escola de deficientes. Em seguida, decidiram que tinha de ser durante o dia porque sabiam que nesse horário ela trabalhava para pagar as contas. Por fim, como Eva não desistisse, desistiram eles de a impedir.

Quando o nome de Eva foi pronunciado na formatura, todos levantaram, gritaram, aplaudiram. Eva não ouviu. Todos os seus sentidos estavam concentrados em não cair. Atravessar aquele palco sem tropeçar era a metáfora de sua vida. Eva não cairia. Não ali. E Eva não caiu. (...)

* Matéria originalmente publicada em 14 de agosto de 1999
no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, e reproduzida em
A Vida que Ninguém Vê (Eliane Brum, 2006)

- vencedor do Prêmio Jabuti de 2007 na categoria "Melhor Livro de Reportagem".

segunda-feira, 30 de março de 2009

CICLOVIA: A MORTE ESTÁ AO LADO

PARTE I


Curitiba, oito de fevereiro de 2009, um domingo de sol. Longe do mar e em um cenário como esses, visitar parques e praticar esportes se tornam umas das (poucas) opções de lazer no fim de semana da capital paranaense. Em direção a um dos 26 parques curitibanos, os mais de 100 km de ciclovias que atravessam a cidade são a atração mais movimentada aos sábados e domingos. Um programa gratuito, saudável e ecologicamente correto.

Bairro do Ahú, região central. Às margens do Rio Belém, na ciclovia que segue em direção ao Passeio Público, João Paulo, Maicon e Jhonatan pedalavam distraídos, como tantos outros meninos, em meio ao vai-e-vem de bicicletas. Os guris, no auge de seus 15 ou 16 anos, faziam daquela tarde de verão um dia para sair do Bairro Alto – onde moram – e passear, quase sem rumo, montados em suas bikes vermelho tijolo, verde metálica e bordô.

Mas já no caminho de retorno, uma paisagem se ergueu súbita em frente aos três; paisagem estranha ao que se costuma ver nas rotas dos ciclistas. João Paulo, Maicon e Jhonatan correram afoitos em direção ao inesperado. E se aproximaram o suficiente para avistarem, incrédulos, o corpo de um homem jogado no canal do Belém. Seria fúnebre demais para que fosse verdade. Mas era. Na galeria de um rio que há muito virou esgoto, repousava a carcaça de um cadáver.

E assim era o que se via: um homem de bruços, cabelo raspado à máquina, calça de moletom azul, camisa aos trapos manchada pela água suja e densa. Nos pés, um par de um modelo Nike Shox. No corpo de costas, aparentemente não havia marcas de sangue. Ainda assim, era possível ver uns quatro ou cinco hematomas inchados nas costas descamisadas. Por certo, resultado dos obstáculos no macabro percurso do corpo na canaleta do rio.

Como os três meninos, uma família que por ali passava também percebeu o homem, prostrado em sua morte. Os olhares mais atentos viram e não deixaram de enxergar: perto da grama verdinha que vende Curitiba, havia um corpo falecido, entre ratos e dejetos.
(continua nos próximos posts)

segunda-feira, 16 de março de 2009

MEMÓRIAS PÓSTUMAS: O OSCAR DE HEATH LEDGER



Já era de se esperar – ou, no mínimo, de se suspeitar. Na cerimônia do Oscar® 2009, a Academia de Ciências Cinematográficas de Hollywood reconheceu Heath Ledger como o melhor ator coadjuvante do ano anterior. Um Oscar, porém, infelizmente póstumo.

Ledger foi premiado por sua já memorável atuação em “Batman - O Cavaleiro das Trevas” (The Dark Knight – EUA, 2008). Filme que, não fosse a interpretação do ator, certamente não causaria tanta repercussão. Aliás, “O Cavaleiro das Trevas” acabou por ser um dos melhores filmes do ano. A atuação de Ledger na pele do enigmático Coringa é uma das mais marcantes para um personagem do gênero – ou alguém se lembra de atuação melhor em uma aventura de super-heróis?


O australiano morreu em janeiro de 2008 e não chegou a ver a (boa) impressão que o seu Coringa despertaria diante da crítica mundial. A morte, causada por uma overdose acidental de remédios, se deu cinco meses antes da estréia do filme.

Heath Ledger estrelou a lista dos cinco melhores atores coadjuvantes concorrentes à estatueta ao lado de nomes já consagrados, como Robert Downey Jr. - indicado por “Trovão Tropical” (Tropic Thunder – EUA/Alemanha, 2008) –, e Philip Seymour Hoffman, por “Dúvida” (Doubt – EUA, 2008). Acabou superando a performance de seus colegas.

Até a cerimônia do Oscar® 2009, apenas Peter Finch havia recebido premiação póstuma: em 1976, a academia agraciou o trabalho de Finch em "Rede de intrigas" (Network – EUA, 1976), dois meses após o ator sofrer um ataque cardíaco fatal.

Ledger já fora indicado ao Oscar por sua atuação em "O Segredo de Brokeback Mountain" (Brokeback Mountain - EUA, 2005), na pele do cowboy Ennis Del Mar. Naquela ocasião - edição de 2006 -, o ator concorreu ao prêmio de melhor ator, sendo, no entanto, vencido por Philip Seymour Hoffman pelo filme “Capote” (Capote – EUA, 2005). Ironia ou não, o mesmo Hoffman que, no Oscar® 2009, não superou o brilhantismo de Ledger e seu Coringa. Pelo menos, não na visão quase unânime da academia e de cinéfilos espalhados pelo mundo.

quarta-feira, 11 de março de 2009

CÂMARA MUNICIPAL HOMENAGEIA MULHERES DE CURITIBA

Sessão solene marca o Dia Internacional da Mulher



Na noite da última segunda-feira (9), a bancada feminina da Câmara Municipal de Curitiba, composta pelas vereadoras Julieta Reis, Professora Josete, Noemia Rocha, Renata Bueno, Dona Lourdes e Mara Lima, prestou tributo às mulheres que se destacaram em suas áreas de atuação na cidade. Ao todo, 30 nomes foram homenageados na sessão solene, que se realizou no plenário do Palácio Rio Branco.
A vereadora Professora Josete (PT) ressaltou o papel social igualitário assumido pela mulher enquanto sujeito político no desenvolvimento sócio-econômico. Além disso, Josete lembrou a história da celebração do Dia Internacional da Mulher e apresentou números sobre a violência doméstica.

O dia 8 de março

Em 8 de março de 1857, mulheres operárias paralisaram as atividades de uma fábrica de tecidos de Nova York para reivindicar melhores condições de trabalho. Nas exigências, estavam a redução de horas de serviço na carga diária e a equiparação de salários com os dos homens, além de tratamento digno diante das tarefas por elas realizadas.
A manifestação, porém, foi reprimida com total violência. As mulheres foram trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Aproximadamente 130 tecelãs morreram carbonizadas.
Somente em 1975, o dia 8 de março passou a ser comemorado oficialmente pelas Nações Unidas como Dia Internacional da Mulher.

Elzira Cocchieri

Dentre os nomes agraciados na solenidade da câmara, estava o da empresária Elzira Cocchieri, 71, indicada para a homenagem pela vereadora Julieta Reis, do Democratas.
Com muita garra, talento e determinação, Elzira sempre trabalhou para o prestígio da marca Gianni Cocchieri – empresa que fundou há 25 anos. Profissional de habilidade e de vigor, contribui de maneira marcante para o ramo da moda paranaense. Sua grife é aclamada entre os profissionais da alta costura e reconhecida pela qualidade de seus produtos, além se ser vestuário certo nos principais eventos sociais de Curitiba.
Atualmente, Elzira e sua empresa promovem um projeto social na Penitenciária Central do Estado, em Piraquara, Região Metropolitana. Um grupo de detentas tem recebido aulas de costura, ministradas por profissionais da Gianni Cocchieri. Graças a essas novas lições de moda e de vida, as mulheres de Piraquara já podem traçar perspectivas para um futuro mais próspero.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

ARTIGO: O ALTERNATIVO, A PARTE E O TODO



Ser alternativo é propor distintas possibilidades de reflexão em meio às mesmices e aos tantos clichês ‘impostos’ por padrões sócio-culturais. É fazer emergir discussões sobre temas considerados oblíquos, geralmente negados dentro de um âmbito social. É promover uma mediação acerca de determinada ideologia desconhecida, a ponto de torná-la ‘notória’. É respeitar qualquer esfera de conhecimento ou de comportamento diferente das ‘habituais’. É conviver harmonicamente ao lado do ‘incomum’, deixando de lado pré-julgamentos. E é, acima de tudo, respeitar a posição das minorias. Afinal, tanto os grupos maiores, quanto os menores, são porções que fazem parte de um mesmo todo maior: a sociedade.


"O todo sem a parte não é todo
A parte sem o todo não é parte
Mas se a parte faz o todo, sendo parte
Não se diga, que é parte, sendo todo".


Salve salve um dos pioneiros da 'mídia alternativa', Gregório de Matos - o "Boca do Inferno".

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

ARTIGO: DOIS MILÉSIMO NONO


Pretensão seria bradar por um 2009 especialmente diferente de anos outros. Afinal, em que esse novo ano se diferenciaria diante dos anteriores - sejam eles contemporâneos de uma mesma década ou decorridos séculos atrás? Talvez em quase tudo. Ou em nada.

O avanço das demandas tecnológicas, em suas mais específicas áreas de aplicação – da ciência à arte -, é ininterrupto. Continuamente volúvel, por assim dizer. Sujeito a mudanças, a cada dia, a cada vez. Não, nenhum ano é igual ao outro tomando como comparação o desenvolvimento da tecnologia - vide 2008 e suas tantas novidades.

A corrupção, por sua vez, em todos seus níveis – do livro não devolvido ao escândalo do mensalão -, parece-me um mal imutável. Para não dizer eterno. Corrupta é a humanidade desde a sua essência – do dantes ao porvir. Corrupções a menos ou a mais, em todos os anos são iguais.

Tecnologia e corrupção. Um antagonismo, em verdade. Ambas inevitáveis, na eternidade do "mais do mesmo". Uma, porém, sujeita ao “admirável mundo novo” das evoluções; outra presa ao inerente mal ancestral.

2009 não será igual. Tampouco diferente.

Um ano "novo" a todos!

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

(Carlos Drummond de Andrade, "Receita de ano novo")