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domingo, 15 de fevereiro de 2009

ARTIGO: O ALTERNATIVO, A PARTE E O TODO



Ser alternativo é propor distintas possibilidades de reflexão em meio às mesmices e aos tantos clichês ‘impostos’ por padrões sócio-culturais. É fazer emergir discussões sobre temas considerados oblíquos, geralmente negados dentro de um âmbito social. É promover uma mediação acerca de determinada ideologia desconhecida, a ponto de torná-la ‘notória’. É respeitar qualquer esfera de conhecimento ou de comportamento diferente das ‘habituais’. É conviver harmonicamente ao lado do ‘incomum’, deixando de lado pré-julgamentos. E é, acima de tudo, respeitar a posição das minorias. Afinal, tanto os grupos maiores, quanto os menores, são porções que fazem parte de um mesmo todo maior: a sociedade.


"O todo sem a parte não é todo
A parte sem o todo não é parte
Mas se a parte faz o todo, sendo parte
Não se diga, que é parte, sendo todo".


Salve salve um dos pioneiros da 'mídia alternativa', Gregório de Matos - o "Boca do Inferno".

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

ARTIGO: DOIS MILÉSIMO NONO


Pretensão seria bradar por um 2009 especialmente diferente de anos outros. Afinal, em que esse novo ano se diferenciaria diante dos anteriores - sejam eles contemporâneos de uma mesma década ou decorridos séculos atrás? Talvez em quase tudo. Ou em nada.

O avanço das demandas tecnológicas, em suas mais específicas áreas de aplicação – da ciência à arte -, é ininterrupto. Continuamente volúvel, por assim dizer. Sujeito a mudanças, a cada dia, a cada vez. Não, nenhum ano é igual ao outro tomando como comparação o desenvolvimento da tecnologia - vide 2008 e suas tantas novidades.

A corrupção, por sua vez, em todos seus níveis – do livro não devolvido ao escândalo do mensalão -, parece-me um mal imutável. Para não dizer eterno. Corrupta é a humanidade desde a sua essência – do dantes ao porvir. Corrupções a menos ou a mais, em todos os anos são iguais.

Tecnologia e corrupção. Um antagonismo, em verdade. Ambas inevitáveis, na eternidade do "mais do mesmo". Uma, porém, sujeita ao “admirável mundo novo” das evoluções; outra presa ao inerente mal ancestral.

2009 não será igual. Tampouco diferente.

Um ano "novo" a todos!

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

(Carlos Drummond de Andrade, "Receita de ano novo")

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

ARTIGO: 2008 E SUAS TRAGÉDIAS

Não me restam dúvidas de que o Brasil, em 2008, foi sucumbido por tragédias. E tragédias em suas diversas facetas - considerando o sentindo amplo do termo, que engloba tanto grandes catástrofes e acontecimentos fatídicos, quanto desventuras individuais (que, ainda que efêmeras, por vezes acabam alçadas à condição de “grandes dramas coletivos”).

Aliás, nesse ano, muitos foram os dramas pessoais transformados em alvo de badalação e que despertaram horror entre cidadãos sequer envolvidos em tais fados. Foram, de fato, tragédias, na medida em que culminaram em terror, morte e, sobretudo, tristeza aos próximos. Ainda assim, talvez não fosse o caso de esses episódios de conseqüências restritas aos envolvidos terem se tornado o “almoço e jantar” de um sem número de cidadãos alheios. Mas foram.

A menina Isabella

Como não se lembrar do mais do que explorado caso Isabella Nardoni? Em 29 de março, a menina de cinco anos foi atirada do sexto andar do Edifício London, em São Paulo. Pelo que se suspeita (ou melhor, pelo que quase se confirma), tal atrocidade foi cometida por Alexandre e Anna Carolina, pai e madrasta.

Uma sinistra trama familiar, com seus vilões e heróis – a mãe, também Ana Carolina, foi aclamada “heroína” em seu sofrimento. Mesmo de foro íntimo, no entanto, o episódio virou "atração nacional" por mais de um mês. O anseio coletivo por justiça beirou o fanatismo pela desgraça alheia. E aquela que seria uma tragédia exclusiva às famílias Nardoni, Jatobá e Oliveira se tornou um dos fatos trágicos mais lembrados pelos brasileiros em 2008.

Eloá e Rachel

Dentre outros assassinatos brutais – e que de um universo particular também se desdobraram em manchete nacional -, estão as barbáries contra Eloá e Rachel, respectivamente: a ex-namorada de Lindemberg, feita refém em cárcere privado, na cidade de Santo André, e morta no quinto dia de seqüestro pelo próprio rapaz; e a guriazinha curitibana encontrada já sem vida e com sinais de estupro em uma mala na Rodoferroviária da capital do paranaense. Ambos os casos - em especial o seqüestro no ABC paulista – receberam intensa veiculação da mídia e foram pauta de incontáveis edições de telejornais e demais publicações.

A exposição dos fatos frente aos veículos da imprensa foi determinante para que desgraças pessoais como essas ganhassem notoriedade em todo o país, mesmo sem uma franca relevância aos brasileiros.

Catástrofes naturais

Como há muito não se via, pelo menos não com tanta intensidade, em 2008 vários foram os dramas individuais convertidos em tragédias – e isso talvez devido à “sede pela tormenta alheia” inerente à espécie humana.

Mas o que dizer das catástrofes naturais e dos desastres ambientais ocorridos no Brasil; aquelas tragédias que, de fato, deveriam despertar a legítima atenção de toda a população? Por parte de muitos, não receberam a vigilância condizente ao peso de sua relevância.

Há um enorme desastre ambiental ocorrendo no norte do Brasil; desastre esse que inacreditavelmente está sujeito à sombra de outros fatos corriqueiros e banais. A Amazônia se mostra cada vez mais degradada – e cada vez menos respeitada. A floresta já perdeu quase 20% do seu tamanho original. Uma lamentável tragédia, que acaba despercebida em vidas cosmopolitas distantes da floresta.

A região sul, por sua vez, foi palco de uma intempérie da natureza. No “país tropical abençoado por Deus”, o estado de Santa Catarina foi engolido por tormentas e conseqüentes enchentes na iminência do verão. No Vale do Itajaí, a região mais atingida, cidades arrasadas, famílias desabrigadas e 131 mortos em uma das maiores catástrofes naturais registradas em território nacional.

Uma vez mais, dramas de pessoas anônimas foram explorados à exaustão. Não que se conteste a lástima dos atingidos, ou que se despreze as vidas perdidas. Mas há de se considerar, tão veemente, os efeitos ambientais, não menos trágicos do que as desgraças humanas. Outras catástrofes como a catarinense são ameaças certas. E não só: são ameaças bem maiores e mais prováveis do que um pai que joga a criança da janela ou do que um namorado que seqüestra a ex - até porque, não são todos os capazes de cometer tamanhos absurdos.

Tragédias maiores, tragédias menores, mais ou menos relevantes, mais ou menos creditadas. Afinal, como medir uma tragédia e atribuir a ela um grau de importância social? Pela legítima importância em uma sociedade? Pelas mortes provocadas? Pela comoção despertada? Ou pela espetacularização da mídia?
Em 2008, um patrimônio do Brasil esteve à mercê do descaso dos próprios brasileiros. No outro meridiano do país, os efeitos colaterais do descaso à natureza - que se alastram da Amazônia aos pampas - deixaram um estado submerso em água, lama e tristeza. Mas foram Isabella, Eloá, Rachel e as tantas outras vítimas de crimes espetacularizados os que estiveram em foco, assim recebendo uma atenção descabida. Ganharam o estigma de grandes tragédias nacionais. Ainda que não tenham sido.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

SURREALISMO

Movimento fez da imaginação o seu princípio artístico


O sonho não pode ser também aplicado
à solução das questões fundamentais da vida?



A frase acima é um fragmento pertencente ao Manifesto do Surrealismo, idealizado pelo poeta e psiquiatra francês André Breton, em 1924, na cidade de Paris. O texto, em sua íntegra, sugere as diretrizes do movimento que fez da espontaneidade psíquica o seu princípio artístico.


O Surrealismo foi uma corrente de vanguarda emergente no período do “entre-guerras” europeu, na década de 20. Permeado pelas teorias freudianas, o movimento revela o papel das manifestações espontâneas do inconsciente na atividade criativa – o chamado automatismo psíquico. A visão artística surrealista se abstém das exigências intelectuais da razão para fazer expressar a imaginação. Nesse antagonismo à lógica e ao domínio da consciência, explora-se a força criativa do subconsciente, por meio da visão fantasiosa sobre aspectos reais, da ênfase no caráter poético e do abandono das formas convencionais de representação.


As manifestações surrealistas emergem como oposição à suposta racionalidade da ciência, da religião e da moral pregada pela sociedade burguesa do início do século XX. O Surrealismo explora a imaginação – parâmetro oposto à racionalidade -, valorizando a livre associação de pensamentos, os sonhos e a força criativa do subconsciente. Nesse aspecto, a corrente surrealista se norteia pelas teorias psicanalíticas de Sigmund Freud, que mostram a importância do inconsciente na criatividade do ser humano. Para Freud, a psique humana deveria se desprender da lógica racional/intelectual imposta pelos padrões comportamentais e morais da sociedade para, assim, dar vazão aos "ecos" e às manifestações oníricas do inconsciente.


O automatismo psíquico, expressão espontânea de um pensamento não-racional, é um dos princípios nos quais surrealistas se fundamentam quando da criação de suas obras. Outros recursos explorados pelos artistas são o humor e a chamada contra-lógica. Os artistas apresentam trabalhos artísticos que depreciam valores pré-ditados pela burguesia operante, através de devaneios inconscientes da sondagem do mundo interior – portanto, uma visão subjetiva e surreal de uma realidade mensurável.
As principais manifestações surrealistas se encontram nas artes plásticas – sobretudo, na pintura. O mundo concreto foi expresso diante dos livres impulsos do automatismo psíquico. Nas telas, as formalidades reais se aproximam ao fantástico, ganhando contornos imaginários e não-convencionais, permeados pela subjetividade de cada artista.

Expoentes

 O Carnaval de Arlequim - Joan Miró















Joan Miró (1893-1983), artista espanhol, conseguiu agregar características oníricas à realidade estampada em suas obras, conservando o frescor da imaginação alheio ao julgamento intelectual.

Suas telas mostram traços nítidos e formas sinceras na aparência, mas difíceis de serem elucidadas - embora se apresentem de forma amistosa ao observador. Maternidade (1924), O Carnaval do Arlequim (1924-25) e Noturno são reconhecidas obras de Miró.


Salvador Dali (1904-1989) é o mais conhecido dos artistas do Surrealismo. Suas obras singulares são facilmente reconhecidas pela combinação de imagens bizarras e oníricas, com excelente qualidade plástica. Criou o conceito de “paranóia critica” para referir-se à atitude de quem recusa a lógica que rege a vida comum das pessoas. A Persistência da Memória (1931) – cena em que relógios se derretem - é o quadro símbolo da geração.


No cinema, os diretores romperam com o tradicionalismo cinematográfico de até então. Assim como em todas as outras manifestações surrealistas, os ideais da burguesia e de entidades como a Igreja e o Estado são retaliados. A não-continuidade dos enredos é marca da desconstrução da realidade factual, que ganha interpretações e contornos fantasiosos. Dentre os clássicos do gênero destacam-se Um Cão Andaluz (1928) e L'Âge D'Or (1930), ambos do diretor Luís Buñuel em parceria com Salvador Dali.




Trailler de Um Cão Andaluz (Un Chien Andalou - 1928).

sexta-feira, 11 de abril de 2008

ENCONTRANDO O INDOMÁVEL

“Há rumores de que um cara está construindo um barco no Bairro Alto”



O assunto já estava em pauta há, pelo menos, duas semanas. Ainda assim, em todo esse tempo, nenhum repórter do Capital da Notícia Zona Leste havia se deslocado para checar a informação. Alguns colegas de redação estavam, de fato, ocupados com coberturas mais emergenciais. Contudo, um outro contingente, aparentemente disponível, não demonstrou interesse pela pauta. Dessa maneira, a história do barco acabou por ficar na gaveta durante algum tempo – precisamente, desde o dia 25 de março.

Sexta-feira, 4 de abril de 2008, 19h22. Após constatar que a pauta, uma vez mais, não estava nos planos de cobertura da editoria para aquela edição do jornal (nº. 05), decidi conferir a veracidade dos boatos. A minha tarefa: encontrar, em meio à escuridão que já se impunha naquele começo de noite, o tal do morador que estaria construindo uma embarcação.

De imediato, não havia nomes, fontes e, tampouco, endereços precisos que pudessem servir como norteadores para a minha busca. A única informação era a de que o suposto barco estaria ‘ancorado’ em alguma rua próxima à agência do Banco do Brasil – nas imediações da estação-tubo China.

Os dados faltavam, mas a curiosidade, a essa altura, já era grande. Não havia outra opção, portanto, a não ser ‘embrenhar-me’ pelas estranhas do Bairro Alto para encontrar a história. Acionei, então, uma unidade móvel do ZL (leia-se: o carro da minha mãe) e fui em direção à rua José de Oliveira Franco – o endereço da agência bancária.

O próximo passo? Os botecos são sempre ótimas fontes de informação. A vida dos bairros é contada, diariamente, nas mesas dos bares. À primeira vista, nenhum barzinho. Na falta de um, resolvi adentrar em uma vídeo-locadora. Encontrei dois garotos.

- “Boa noite. Por acaso, vocês já ouviram falar de um cara que está construindo um barco aqui por perto”?

-- “Barco?” – um deles indagou – “Ahhh, o Domador”!

Para a minha sorte, logo na primeira abordagem, já havia obtido a confirmação de que a história era verídica. O garoto, então, me repassou as coordenadas do local onde estaria o barco. Antes que eu partisse, no entanto, ele se corrigiu.

-- “Ah, e não é Domador... O nome do barco é Indomável”.

Entrei no carro. Dei meia-volta. Atravessei a principal. Depois de uma quadra, virei à direita. E à direita novamente. Foi quando, em uma ruazinha mal iluminada, eu avistei o Indomável. De primeira impressão, um susto: tratava-se de um barco de ferro (ao contrário do que supunham as minhas expectativas em encontrar uma embarcação de madeira – no melhor estilo ‘a arca de Noé’).

Aliás, no trajeto da faculdade até a locadora, não conseguia imaginar nada além de uma arca construída por um seguidor inveterado das tábulas da Sagrada Lei (vide o filme Todo Poderoso II).

Sem parar de olhar para o barco, bati palmas em frente ao portão daquela casa da rua Adílio Ramos. Fui atendida por uma mulher tímida, que vestia um sobretudo preto. Era Lenir Siqueira. Falei que tinha interesse em saber sobre a construção do veleiro. E, em instantes, já estava à porta o idealizador da embarcação, Pedro Luiz Costa, serralheiro, 45 anos, marido de Lenir.

Fui convidada a entrar e a ouvir a incrível história de um homem que tem por grande desafio pessoal a construção de um barco, a próprio punho. Ao contrário do que eu pensava, não, ele não é movido por medo de um possível dilúvio. A verdadeira inspiração que move Pedro a construir uma embarcação de 29 pés, sob os olhares curiosos de todos os vizinhos, é uma só: ele quer viajar pelos sete mares.


Na última edição do Capital da Notícia Zona Leste, vocês, caros leitores, conheceram um pouco sobre a história do ‘barco do Bairro Alto’. Agora, cabe a vocês acompanharem, de perto – através dos rumores do bairro -, o desfecho dessa história: Pedro conseguirá velejar mundo a fora com seu Indomável?

sábado, 5 de abril de 2008

UM BARCO APORTADO NO JARDIM

Morador do Bairro Alto constrói à mão um veleiro para navegar pelos sete mares


Pedro ainda era um garoto quando viu o mar pela primeira vez. Na praia de Itanhaém, litoral paulista, o menino de 7 anos estava sentado à beira-mar, maravilhado com a imensidão do oceano, quando avistou o Arquipélago de Alcatrazes. "Um dia eu vou ter um barco pra chegar até aquela ilha, lá longe". E, em meio ao entusiasmo da criança, surgiu aquele que seria o maior desejo de Pedro Luiz Costa.

Muito tempo depois, sentado à beira de uma represa, também em São Paulo, o mesmo Pedro, agora já mais velho, via que os ocupantes de uma embarcação tinham muito mais sorte na pesca do que ele. Foi quando percebeu que sua pescaria seria mais farta se estivesse, assim como os outros, dentro de um pesqueiro. "Por que eu não construo um barquinho desses"?

Há cerca de um ano e meio, na rua Adílio Ramos, à vista de todos os vizinhos, começou a ser erguida uma embarcação de 29 pés (8,84 metros de comprimento), construída com chapas de aço de três milímetros. Trata-se de Indomável, um veleiro oceânico que tem despertado a curiosidade dos moradores da região.



Pedro e seu veleiro Indomável


O serralheiro Pedro, 45 anos, conta que o projeto do seu Indomável nasceu da vontade de possuir um barco próprio, 15 anos atrás - durante a pescaria com os amigos. Sem condições financeiras, só havia uma saída para ver seu sonho concretizado: construir uma embarcação com as próprias mãos. Passou, então, a descobrir a engenharia náutica, através de revistas e livros especializados. Na internet, buscou projetos para veleiros e encontrou orientação específica em grupos de discussão de construtores amadores.

À medida em que foi adquirindo conhecimento, a idéia da construção do veleiro amadureceu. Em uma de suas consultas, Pedro encontrou o desenho de um veleiro projetado por um russo. O modelo desenvolvido estava disponível gratuitamente a quem quisesse colocá-lo em prática. A partir de março de 2006, com base no plano vélico obtido, deu-se início ao desenvolvimento do projeto da sua embarcação ideal.

Foram horas de trabalho a fio, arquitetando o barco. Depois de seis meses, o desenho do Indomável estava pronto, com suas medidas finais ajustadas e definidas: o veleiro projetado terá peso de 4.200 quilos, três metros de 'boca máxima' (largura), e será propulsionado a velas e por um motor a diesel de 20 HPs. Após a conclusão dos cálculos, Pedro iniciou a montagem do protótipo. Numa escala de 1/10 metros, a maquete, desenvolvida em lâminas de madeira, incluiu cada detalhe do barco: do casco à cabine interna com a cama de casal.

Hoje, Pedro utiliza-se, com perícia, de termos técnicos e demonstra, em suas conversas sobre navegação, o vasto conhecimento teórico obtido com as pesquisas. E o resultado prático de sua diligência está aportado no gramado em frente à sua casa. O imenso Indomável - nome que faz alusão à persistência de Pedro - cresce a cada fim de semana, sob os olhares atentos do construtor, de sua mulher, Lenir Siqueira, 40 anos, e de toda a vizinhança.

O veleiro está 'ancorado' na calçada da rua, do lado de fora do portão da casa de Pedro. E o medo de ser roubado? Ele responde de letra: "se levarem o Indomável, com certeza não vão conseguir passar despercebidos". Se, por um lado, o roubo é uma hipótese não cogitada, por outro, o vandalismo é fato presente. A embarcação já foi alvo, por duas ocasiões, de pichações na lataria. A mesma carcaça de aço é alvo, também, da ação da ferrugem e da corrosão. Mas, segundo o serralheiro, esses fatores externos já eram previstos e, por isso, não acrescentam valores extras à execução da empreitada.

De acordo com as planilhas de custo, o gasto total do projeto é estimado em R$ 30 mil - incluindo decoração de interiores e eletroeletrônicos. Para Pedro, uma economia e tanto. "Construir um barco, geralmente, é muito mais caro do que comprar um barco finalizado". De fato: a construção de um veleiro Multishine 28 (um dos mais renomados do ramo náutico) custaria entre R$ 220 e 250 mil reais; um modelo novo, idêntico ao barco, é vendido por 200 mil; já uma embarcação com 30 anos de uso não seria vendida por menos de 80 mil. A construção do Indomável, no entanto, deverá custar apenas 12% do valor de mercado da construção de uma embarcação similar. "Isso só prova que é possível montar um barco mesmo sem muito dinheiro".

Pedro espera que o seu veleiro esteja finalizado até o fim de 2009 - já com toda a estrutura de embarcação (casco, velas, mastros, motor e interiores). Após a finalização, o Indomável deverá passar por uma vistoria técnica, realizada pela Marinha do Brasil, que autorizará - ou não - sua circulação marítima (através de um certificado de arqueação). Só então Pedro, acompanhado da esposa, poderá concretizar a utopia que nasceu naquela praia de São Paulo. "Quero velejar atrás da liberdade. O meu barco vai ser pequeno, mas o meu quintal vai ser o mundo".