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sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

DIFERENTES



Pode ser – ou certamente é – um tanto tarde para rememorar a viagem que fiz no último março. A ocasião, porém, mostra-se propícia; a entrada de um novo tempo tende a ser – e certamente é – a instância ideal para que se olhe para trás e se reflita sobre o que de melhor ou mesmo de pior ocorreu no ano findo. Às margens da virada, retrospectivas de toda sorte invadem a TV, os impressos, as timelines e as reminiscências coletivas, fazendo-nos refletir sobre aquilo que não volta, mas que, quando bom, permanece.
Quiçá o correr de dez meses desde as chegadas e partidas europeias tenha ofuscado algumas minúcias da minha expedição. Já não sei nomear alguns lugares por onde andei, restaurantes em que comi, coletivos que tomei. O tempo, no entanto, não apagou as delícias de uma experiência que, como diria a canção, deixou o gosto e as fotos, além do vibrante anseio de que se repita o quão breve.
Dia desses, dentre tantas coisas das quais eu já não me lembrava mais, veio-me à mente o exato instante em que desci do avião na pista do aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Momento sutil, felicidade clandestina. O vento cortante daquele dia 2 de março pareceu-me entrar por cada um de meus poros. Era o átimo que separava quimera e realidade: eu estava, sim, na Europa, ainda que teimasse em não acreditar. O frio imediato sentido depois da rajada, gélida, nada mais foi que o cartão de boas-vindas ao Velho Continente, obnubilado sob o clima nublado que se mostraria onipresente no fim do inverno europeu. O vento que surrou o corpo, marcou para sempre a alma.
Paris, na ocasião, ainda não se despiria; fora apenas uma pausa antes da conexão para Cardiff - a dantes desconhecida capital do País de Gales, prado legítimo da rainha-mãe assim como Inglaterra, Escócia e Irlanda do Norte. Acolhedora, Cardiff foi a primeira escala da incursão que durou 28 dias e percorreu, além da terra dos galeses, também ruas, avenidas e o cotidiano de Inglaterra (em Londres), França (em Paris) e Espanha (em Madrid).
As ruminações, desde então, tornaram-se contínuas. Perenes. As novas vivências dilataram minhas retinas. Depois da viagem, passei a contemplar os dias através das lentes glaucas e enriquecedoras trasladas frente ao meu olhar. Quem viveu coisa semelhante, seja lá em que lugar e circunstância, bem sabe o que os ares e até os ventos de uma terra incógnita provocam: partimos uns, voltamos outros. Melhores? Diferentes.


Musée du Louvre, Paris. Março de 2012.