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sábado, 5 de abril de 2008

UM BARCO APORTADO NO JARDIM

Morador do Bairro Alto constrói à mão um veleiro para navegar pelos sete mares


Pedro ainda era um garoto quando viu o mar pela primeira vez. Na praia de Itanhaém, litoral paulista, o menino de 7 anos estava sentado à beira-mar, maravilhado com a imensidão do oceano, quando avistou o Arquipélago de Alcatrazes. "Um dia eu vou ter um barco pra chegar até aquela ilha, lá longe". E, em meio ao entusiasmo da criança, surgiu aquele que seria o maior desejo de Pedro Luiz Costa.
Muito tempo depois, sentado à beira de uma represa, também em São Paulo, o mesmo Pedro, agora já mais velho, via que os ocupantes de uma embarcação tinham muito mais sorte na pesca do que ele. Foi quando percebeu que sua pescaria seria mais farta se estivesse, assim como os outros, dentro de um pesqueiro. "Por que eu não construo um barquinho desses"?
Há cerca de um ano e meio, na rua Adílio Ramos, à vista de todos os vizinhos, começou a ser erguida uma embarcação de 29 pés (8,84 metros de comprimento), construída com chapas de aço de três milímetros. Trata-se de Indomável, um veleiro oceânico que tem despertado a curiosidade dos moradores da região.



Pedro e seu veleiro Indomável


O serralheiro Pedro, 45 anos, conta que o projeto do seu Indomável nasceu da vontade de possuir um barco próprio, 15 anos atrás - durante a pescaria com os amigos. Sem condições financeiras, só havia uma saída para ver seu sonho concretizado: construir uma embarcação com as próprias mãos. Passou, então, a descobrir a engenharia náutica, através de revistas e livros especializados. Na internet, buscou projetos para veleiros e encontrou orientação específica em grupos de discussão de construtores amadores.
À medida em que foi adquirindo conhecimento, a idéia da construção do veleiro amadureceu. Em uma de suas consultas, Pedro encontrou o desenho de um veleiro projetado por um russo. O modelo desenvolvido estava disponível gratuitamente a quem quisesse colocá-lo em prática. A partir de março de 2006, com base no plano vélico obtido, deu-se início ao desenvolvimento do projeto da sua embarcação ideal.
Foram horas de trabalho a fio, arquitetando o barco. Depois de seis meses, o desenho do Indomável estava pronto, com suas medidas finais ajustadas e definidas: o veleiro projetado terá peso de 4.200 quilos, três metros de 'boca máxima' (largura), e será propulsionado a velas e por um motor a diesel de 20 HPs. Após a conclusão dos cálculos, Pedro iniciou a montagem do protótipo. Numa escala de 1/10 metros, a maquete, desenvolvida em lâminas de madeira, incluiu cada detalhe do barco: do casco à cabine interna com a cama de casal.
Hoje, Pedro utiliza-se, com perícia, de termos técnicos e demonstra, em suas conversas sobre navegação, o vasto conhecimento teórico obtido com as pesquisas. E o resultado prático de sua diligência está aportado no gramado em frente à sua casa. O imenso Indomável - nome que faz alusão à persistência de Pedro - cresce a cada fim de semana, sob os olhares atentos do construtor, de sua mulher, Lenir Siqueira, 40 anos, e de toda a vizinhança.
O veleiro está 'ancorado' na calçada da rua, do lado de fora do portão da casa de Pedro. E o medo de ser roubado? Ele responde de letra: "se levarem o Indomável, com certeza não vão conseguir passar despercebidos". Se, por um lado, o roubo é uma hipótese não cogitada, por outro, o vandalismo é fato presente. A embarcação já foi alvo, por duas ocasiões, de pichações na lataria. A mesma carcaça de aço é alvo, também, da ação da ferrugem e da corrosão. Mas, segundo o serralheiro, esses fatores externos já eram previstos e, por isso, não acrescentam valores extras à execução da empreitada.
De acordo com as planilhas de custo, o gasto total do projeto é estimado em R$ 30 mil - incluindo decoração de interiores e eletroeletrônicos. Para Pedro, uma economia e tanto. "Construir um barco, geralmente, é muito mais caro do que comprar um barco finalizado". De fato: a construção de um veleiro Multishine 28 (um dos mais renomados do ramo náutico) custaria entre R$ 220 e 250 mil reais; um modelo novo, idêntico ao barco, é vendido por 200 mil; já uma embarcação com 30 anos de uso não seria vendida por menos de 80 mil. A construção do Indomável, no entanto, deverá custar apenas 12% do valor de mercado da construção de uma embarcação similar. "Isso só prova que é possível montar um barco mesmo sem muito dinheiro".
Pedro espera que o seu veleiro esteja finalizado até o fim de 2009 - já com toda a estrutura de embarcação (casco, velas, mastros, motor e interiores). Após a finalização, o Indomável deverá passar por uma vistoria técnica, realizada pela Marinha do Brasil, que autorizará - ou não - sua circulação marítima (através de um certificado de arqueação). Só então Pedro, acompanhado da esposa, poderá concretizar a utopia que nasceu naquela praia de São Paulo. "Quero velejar atrás da liberdade. O meu barco vai ser pequeno, mas o meu quintal vai ser o mundo".

8 comentários:

  1. Anônimo5/4/08 14:35

    Aportada .................
    Dentro da unidade móvel Fox ao som de tiros e grilos lá estava a mamãe.orgulhosa a horas a espera de sua filha prodigia.. Indomavel e eu fazíamos parte daquela escuridão.
    Perguntas do tipo passavam na minha cabeça. Será que encontraram a BARCA de Noé, alguma profecia que eu não conhecia???
    Uhauauauauauau
    Beijos
    Su

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  2. Anônimo5/4/08 19:35

    Eita texto bem escrito, hein? =)

    Adoreeei a história e ainda mostra que nada é impossível nessa vida! É só agarrar o sonho e correr atrás pra realizá-lo! É isso aí!!

    Bjoooooooss Annaaa!! ^^

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  3. Visitei aqui Nannaaaaa! =)

    Adorei o texto! Mas eeeeei, acho q o nome da praia eh Itanhaém viu!
    bjooooo

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  4. Anônimo6/4/08 01:15

    Ler 'Indomável' é pedir pra lembrar de 'Sonhador'. :P

    Nossa, Caroline, nem sabia desse fato! Bairro Alto cheio dos babados fortíssimos!

    Coisa que nem Erivelto noticia, Anna já estréia!

    Pedrão me fez lembrar de um dos personagens do 'bola de sebo' por causa da roupa e do penteado.

    Gosto de suas matérias. Muito! São prazeirosas à vista, gostosas de ler.

    Mas, escute, e as *Crônicas de Caroline* quando virão? Tem que ter crônica na Periódicas!

    Beijão, meu orgulho!

    Amo você.

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  5. Anônimo6/4/08 21:49

    Nem preciso dizer que gostei do seu texto, né? (mesmo depois de ter que contar caracteres de madrugada...rs)

    É o típico texto que você termina de ler e fica com uma vontade - mesmo que momentânea - de colocar em prática tudo aquilo que sempre quis fazer...rs

    Enfim... muito interessante a história e a lição de determinação e persistência que ela passa...

    E a pergunta que não cala...

    Consiguirá Pedro navegar os sete mares com o seu 'Indomável'???

    Como você mesma disse... TO BE CONTINUED...

    Beijão.

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  6. Olá, Anna... Quando em nossa conversa você deu uma olhada no jornal e comentou: "não privilegiou...", eu não imaginava a profundidade que essa frase poderia ter. Fiquei lisonjeado com o tratamento recebido em seu texto, e devo dizer que, dentre todas as pessoas que já me abordaram desde o início da empreitada, foi a primeira vez que alguém alcançou o espírito da coisa em sua essência; privilégio, em verdade, foi despertar a atenção e ter o nome incluido no trabalho de uma verdadeira artista.
    Obrigado, e parabéns!

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  7. Anônimo7/4/08 14:08

    Pútez! Hahahaha! Anna, vc me mata de orgulho! Sexta o Caio tava aqui e a gente deu uma lida no periódicas... mto bom! Ele, que até então não sabia que curso vc faz, disse: "Nossa! Ela é jornalista?" - e eu, com todo o orgulho do mundo, disse: "A Anna? Depois desse show aqui vc ainda pergunta?"

    Huahuaahuahaua!

    Bjooo!

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  8. Anônimo7/4/08 17:02

    Abiga, soube da história do barco de aço(será que o indomável resiste ao frio do Bairro Alto?!)ontem por você e confesso que já fiquei impressionada. Porém, lendo-a achei ainda mais interessante, pois com a qualidade e riqueza de detalhes de seu texto, pude perceber a importância deste sonho para este homem e dos sonhos de cada um de nós!Achei muito importante este tema que trata dos sonhos que umser humano pode ter e com força de vontade e determinação, realizar!
    Muito orgulho de você Añña, que além de escrever de modo envolvente e inteligente, tem a sensibilidade para abordar desde temas do cotidiano, tragédias, sonhos, histórias a textos curtos e criativos, escritos em versos de fotografias antigas ou atrás de presentes de madeira comprados do hippie da Rua XV(lembra?)!
    Abiga, feliz diado jornalista!
    Muito feliz e orgulhosa!

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